sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Arimatéia é executado no próprio quintal e população fechou a BR-316 para pedir justiça

Arimatéia é executado no próprio quintal e população ocupa a BR-316 para pedir justiça
O assassinato do pastor e líder comunitário de uma ocupação localizada às margens da rodovia BR-316 revoltou os moradores do local, que interditaram a pista por pelo menos duas horas, na noite de ontem. Houve agressão aos policiais e tumulto nas negociações, que ainda não tinham dado resultado até a meia-noite. O pastor José de Arimatéia da Silva Bastos, de 45 anos, foi morto com cinco disparos por volta das 19h30, no quintal da residência dele, localizada na altura do km 19 da BR-316, no município de Marituba.

Segundo as primeiras informações policiais, o crime foi motivado por disputas de terra. Uma hora e meia após o assassinato do pastor Arimatéria - como era conhecido -, os moradores da 'Invasão do Canaã' ocuparam a BR-136 no sentido Marituba-Benevides e atearam fogo em pneus e outros objetos. Até aquele momento, o número de manifestantes não era grande e policiais militares começaram a conversar com o grupo, parar liberar o tráfego. Entretanto, dois policiais rodoviários federais entraram na pista com armas em punho, expulsando os manifestantes, e um deles chegou a efetuar um disparo para o chão. O grupo correu para a margem da rodovia e começou a atirar paus e pedras nos policiais militares e rodoviários, que correram e ficaram cerca de 150 metros afastados. Centenas de pessoas se juntaram ao grupo e continuaram o protesto, gritando a palavra justiça.

Carros que iam para Benevides conseguiram continuar viagem ao entrar pelo retorno e trafegar em uma faixa da contramão, mas não puderam mais fazer isso quando, meia hora depois, o outro lado da pista (Benevides-Marituba) também foi fechado pelos manifestantes. Após mais alguns minutos, já eram cinco pontos da rodovia fechados, em ambos os sentidos, impedindo que os carros se movimentassem em qualquer direção. Um dos pontos foi fechado com duas árvores que os manifestantes derrubaram do canteiro central e atearam fogo. Eles ameaçam atirar pedras em qualquer veículo que tentasse furar o bloqueio.

Apenas ambulâncias tiveram autorização para passar. Somente às 23 horas os manifestantes liberaram uma faixa da pista sentido Marituba-Benevides. Segundo eles, a faixa seria liberada durante uma hora e, depois disso, no sentido oposto, os carros também poderiam passar durante uma hora, usando apenas uma faixa. Segundo eles, isso seria feito até que as negociações fossem favoráveis às suas reivindicações.

Os moradores da 'Invasão do Canaã' afirmaram que a morte do pastor tem ligação com a disputa pela terra em que está instalada a ocupação, já que era ele quem lutava pelos direitos dos ocupantes. Segundo eles, o local foi invadido há quase quatro anos e trata-se de uma terra devoluta, ou seja, é uma propriedade pública que não pertence a um dono em particular. Entretanto, apesar disso, as terras (que somariam 910 hectares) foram leiloadas pela Justiça do Trabalho e um empresário (dono de uma grande construtora do Estado) arrematou por R$ 3 milhões. 'É uma terra que vale R$ 54 milhões no mercado, o que mostra claramente que o leilão foi fraudulento, ilegal. A terra é devoluta, e foi a leilão mesmo com três mil famílias morando todos esses anos aqui', disse o pedreiro Edicley Miranda Farias, morador da invasão.

Vítima sofria inúmeras ameaças de morte

Segundo Edicley, que também faz parte da liderança, o pastor Arimatéia vinha sofrendo ameaças de morte e a Justiça tinha conhecimento disso. 'Ele fazia tudo que podia para melhorar a comunidade. E não só ele estava sendo ameaçado. Eu e outras lideranças sofremos ameaças também. Eles (empresários) querem que a gente deixe as terras, mas iremos lutar ou morrer. Ninguém sairá das suas casas', afirmou.

De acordo com Edicley, a liderança comunitária entrou em contato com os empresários e ofereceu o pagamento parcelado dos terrenos. 'Nós ocupamos pouco menos de 20 hectares da terra. Nossa proposta era que cada família passaria vários anos pagando seus terrenos, e no total somaria R$ 4 milhões, mas eles não aceitaram', afirmou.

A mãe do pastor, Elzira da Silva Bastos, disse que há três semanas ela falou com o filho ao telefone e ele a informou sobre as ameaças. 'Ele disse ‘mãe, me ajuda a rezar, porque estou sendo ameaçado de morte’. Eu fiquei tão nervosa que não consegui perguntar por quem, ou o motivo', relatou. Elzira também obteve a informação de que, no sábado, um homem procurou o pastor Arimatéia e ofereceu uma grande quantidade em dinheiro para que ele parasse sua luta junto à comunidade.
Edicley confirmou. 'Ofereceram R$ 500 mil, mas ele disse que só pararia de lutar se estivesse morto. E foi o que fizeram, mandaram matá-lo e ainda reviraram a casa, levando documentos importantes do processo'.

Com medo de morrer, testemunha do crime prefere o silêncio

Por conta do tumulto na rodovia BR-316, a Ronda Tática Metropolitana (Rotam) foi chamada ao local, mas até meia-noite ainda não tinha entrado em ação. O capitão Barros, subcomandante da 18ª Zona de Policiamento (Zpol), conversou com um grupo de manifestantes, pedindo cautela e bom senso. 'Vamos montar uma comissão, e na próxima semana iremos nos reunir com algum representante do governo, para que a situação das terras seja revista e analisada. O que não podemos é prejudicar ainda mais as pessoas que estão tentando chegar em suas casas', afirmou. Entretanto, os manifestantes queriam a presença de alguém do governo estadual no local. Até meia-noite, o impasse continuava.

O crime - O pastor Arimatéira (que também trabalhava com animação de festas, onde era o palhaço Tio Chiclete) estava em sua casa conversando com um morador da invasão. A casa do pastor, de madeira, fica localizada às margens da BR-316, ao lado da entrada da ocupação Canaã. Por volta das 19h30, dois homens entraram no local, pegaram o pastor e o levaram para o quintal, onde ele foi executado.

Segundo informações não confirmadas, os homens ainda entraram na casa e roubaram vários documentos, além da moto da vítima. O rapaz que estava com o pastor não quis falar nada sobre o que viu. 'Eu não queria ter presenciado, e eu não vou falar nada porque se eu falar depois eles virão me matar', disse, aparentando muito nervosismo. Ele foi encaminhado para a Seccional Urbana de Marituba, onde seria ouvido.

A esposa do líder comunitário, que não teve seu nome divulgado, contou à polícia que, anteontem pela manhã, um homem foi até a casa do pastor e perguntou se ainda existia algum terreno para vender na ocupação Canaã. O pastor disse que não, mas a esposa estranhou o comportamento do rapaz, que parecia observar o interior da residência e também a área próxima. Policiais da Divisão de Homicídios foram até o local e colheram informações que possam contribuir nas investigações. (AMAZÔNIA JORNAL)

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